É provável que durante a leitura você fique pensando “novembro tá quase acabando e ela só veio falar disso agora?” Eu sei. E realmente poderia ter dito tudo isso no começo do mês, mas tem coisas que a gente precisa relembrar, puxar pra pauta e não deixar cair no esquecimento, porque uma boa reflexão é atemporal. Mas vem comigo!
Sabe aquela peça de roupa que você vem desejando a tempos e que só encontra se garimpar muito muito muito bem, e quando esse date acontece dá vontade de fazer dela uniforme e sair por aí desfilando pra todo mundo ver?! Então… comprar revistas de moda brasileiras com modelos e celebridades negras é a mesma sensação. Pena que não dá pra ter essa sensação com a Vogue de novembro. Não só desse ano, mas dos outros também.
É engraçado a revista escolher o mês de novembro para celebrar há cerca de 28 anos o Rio, quando o aniversário e protagonismo da cidade maravilhosa é logo no começo do primeiro semestre. “Mas Laíse, novembro é lançamento de tendências alto verão e festa de final de ano. É normal associarem ao Rio…”. Ok, na moda, mês de novembro dá entrada ao verão e Rio de Janeiro é quente, cidade turística e bla bla bla Whiskas sachê. Mas não é no mínimo curioso saber que de 2013 pra cá a revista estampou apenas 6 celebridades/modelos negras? E pior, ainda que fosse apenas para tentar “amenizar o preconceito” nenhuma delas foi capa do mês onze.
Na edição deste ano, a capa da vez foi essa Angel aqui:

“Ok, é a Candice Swanepoel. O que tem demais dessa vez?”
Te digo: Segundo um estudo acadêmico de 2016, realizado pela Anna Orthofer, pós-graduanda na Universidade Stellenbosch, 10% dos sul-africanos, em sua maioria brancos, são donos de mais de 90% da riqueza nacional e cerca de 80% da população, em sua maioria negra, não possui bem algum. Candice é supermodelo, Angel da Victoria’s Secret, loira, beleza padrão e… sul-africana.
Dentro desta edição tem algumas entrevistas e Tais Araújo é uma das entrevistadas. Tem também alguns editoriais e a funkeira Jojo Maronttinni, vulgo Jojo Todynho está em um deles. Tais Araújo, 39 anos, preta, atriz, jornalista, apresentadora, cria do bairro da zona norte Méier, e junto com seu marido também ator, Lázaro Ramos, forma um dos casais negros mais influentes no mundo, segundo a ONU. Jojo Todynho, viral nas redes sociais, 20 anos, cria do bairro da zona oeste Bangu, funkeira, preta e gorda. Negras, influentes e cariocas. Poderiam ter sido capas, mas ambas foram ‘’escondidas’’ dentro da revista.
Essa capa é a representação daquelas pessoas brancas que usam palavras como “afro” pra tudo e falam aquelas famosas e hilárias frases como “mas eu até tenho amigos negros”, “meu tataratataratataratatara avô semi-deus era negro”, “eu não tenho preconceito. Já namorei uma pessoa assim, mais escurinha”, na tentativa de parecerem menos preconceituosas, menos racistas. Essa capa é a representação daquelas pessoas que usufruem de uma determinada cultura e esquecem de dar credibilidade e real conhecimento de sua origem. A propósito, percebeu ali no lado esquerdo da capa o “estilo hip hop”? Doze de novembro comemora-se o dia mundial do Hip Hop. Que coincidência!
Em 2015 também teve coincidência na capa de novembro. A supermodelo gaúcha Carol Trentini. Magra, loira e com uns dreads no cabelo, era a cara do Rio. A cara do verão. Outra coisa curiosa é que pelo menos de 2013 até agora, nenhuma capa “especial Rio” teve rosto carioca.
Até quando a Vogue BR vai ficar nessa demonstração embranquecida de amor ao Rio e nesse roubo de protagonismo? É falta de modelo brasileira negra famosa? Tem Laís Ribeiro, supermodelo e também Angel. É falta de atrizes negras? Tem Tais Araújo, Jéssica Ellen, Nayara Justino (atriz e modelo), Sheron Menezzes, Adriana Alves (atriz e modelo), Jéssica Barbosa (atriz e bailarina), Érika Janusa (atriz e modelo), Cris Vianna (atriz e ex- modelo), Juliana Alves (atriz e modelo), Pathy Dejesus (atriz, modelo, dj e apresentadora) e muitas outras. Reage,Vogue!
Novembro é mês da consciência negra. Todos sabem… menos você.