Quem diria?

Como um simples reposicionamento de mercado, muda os objetivos e metas dos criadores. Final dos anos 90 e início dos anos 2000. Cultura sneaker fervendo na gringa, rappers lançando suas próprias marcas de roupas (g-unit, rocawear, billionaire boys club) e pessoas enxergando que o poder do Hip Hop poderia ir muito além da música. Isso já era um presságio desde o início dos anos 90 com RUN DMC fazendo umas 8 mil pessoas tirar os seus Adidas Superstar dos pés e empunhar eles no alto. Tudo isso em pleno Madison Square Garden.

O contato das grandes labels esportivas (Nike, Adidas, Rebook) com a cultura urbana já era latente, principalmente pela conexão do basquete com o Hip Hop. Vários dos sneakers criados primeiramente para as quadras foram incorporados na cultura Hip Hop (o clássico Air Force 1 é um dos maiores exemplos). Então, por essa proximidade, era de se esperar que essas marcas lançassem produtos diretamente voltados para os consumidores da cultura de rua.

Essas marcas conseguem dialogar com esse público por que elas sempre estiveram por ali. Mas onde poderíamos imaginar que Balenciaga, Gucci, Louis Vuitton fossem criar (ou re-criar) produtos voltados ao público consumidor de cultura urbana? Até que ponto isso é foda e até que ponto isso é extremamente sufocante para novos criadores?

Naquela entrevista clássica do Kanye West no Sway in The Morning, Kanye dá um grito quando o Sway faz um indagação bem pertinente sobre a relação dele com as marcas. Sway pergunta por que Kanye, que já tinha um patamar de magnata tanto como um cara criativo quanto como um cara que já tinha grana, ainda precisava dessas grandes marcas se ele sozinho já poderia assumir toda a parte de produção e distribuição dos seus produtos. Era um momento complicado na vida do Kanye pois ele tinha acabado de encerrar o contrato que tinha com a Nike. Kanye deu a clássica resposta em forma de grito:

“ YOU AIN’T GOT THE ANSWERS SWAY”

Você não possui as respostas Sway. Você é muito pequeno e não entende como o jogo funciona, foi mais ou menos isso que Kanye quis falar nessa frase. E ao mesmo tempo que Kanye deixou isso bem claro, ele também se colocou como pequeno perante toda uma indústria gigantesca que influencia e produz de forma global. Mesmo Kanye com toda a sua influencia e com toda a sua grana, é impossível ele entrar em competição com uma Adidas, por exemplo. É mais vantajoso pro Kanye se aliar com a marca do que lançar a própria coleção dele pela marca dele. Foda mas também sufocante.

Esse cara da foto de abertura se chama Salehe Bembury. Ele é um dos designers do YEEZY e foi descoberto por Kanye quando trabalhava na incrível e revolucionária marca “Greats”. Nascida no Brooklin, a Greats foi criada em 2012 o intuito de criar os melhores sneakers para homens e mulheres e vender diretamente para o seu consumidor. Sem distribuidores, a marca garantiria o melhor preço dos seus sneakers e tinha Salehe como seu designer principal antes de ele ser contratado por Kanye. Greats foi extremamente elogiada por inúmeras publicações (Vogue, Complex, GQ, Esquire) pela sua coragem e arrojo no seu design e principalmente pelo seu modelo de negócio. Quando ainda estava na Greats, Salehe deu uma entrevista bem interessante para a plataforma de empregos Monster e deu a seguinte declaração:

“Quando você está em uma grande empresa você faz parte desta máquina que, na teoria, pode seguir em frente sem você, enquanto que, aqui na Greats, são sete pessoas. Todos somos igualmente importantes”.

Na Greats ele tinha a liberdade de criar o que ele acreditava e tinha proximidade extrema com seus líderes e seus consumidores. Esse era o grande diferencial de se trabalhar numa marca com potencial extremo de crescimento mas que ainda não era uma gigante do mercado. Logo após ser contratado por Kanye para ser um dos designers do YEEZY, Salehe assinou um contrato com a italiana e gigante de alta costura Versace. Isso mesmo, a Versace contratou um designer negro de Nova York para comandar a sua linha de sneakers.

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A cultura negra (Hip Hop = Negro) é tão absurdamente forte que faz mudar paradigmas onde nem as vezes quem faz parte dessa cultura percebe o tamanho do impacto que causamos. Quem diria que a Gucci faria roupas especificamente para rappers (2 Chainz só usa Gucci) para atingir o público que o MC influencia. Quem diria que a Versace criaria uma linha de sneaker para atingir um público voraz que consome a cultura urbana, não necessariamente sendo negros mas que foram totalmente influenciados por eles. Ou quem diria que o incrível e revolucionário Dapper Dan, fosse hoje – já bem coroa – respeitado e convidado para desfiles das grandes marcas que ele um dia copiou.

A necessidade de inclusão e a sensação de pertencimento fazem com que criadores empreendam nos seus sonhos e tenham o objetivo de mudar algo que já esteja em vigor. Sempre foi assim na visionária cultura Hip Hop. Quando quem sempre determinou regras e valores de consumo se rende a nossa criatividade e poder de mudança, é de se achar incrível num primeiro momento mas extremamente limitador num segundo. Ocupamos o espaço que sempre disseram que não era para nós mas deixamos de fortalecer o espaço que nos colocou em destaque. Foda mas sufocante.

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