O maior objetivo de um artista é ser livre. Livre pra mostrar sua obra, seus sentimentos, suas ambições e devaneios. E essa liberdade é acompanhada pela vontade do artista em ser unânime. Dizemos que não mas ligamos muito para a opinião alheia. No final das contas, ser compreendido é basicamente o que queremos. Tudo aqui é tão denso e tão intenso que achamos que todos tem que aceitar e agregar aquilo que estamos jogando para fora.
Fui ver o show incrivelmente bonito do Mano Brown, que apresentou o seu mais novo trabalho “Boogie Naipe”, e no meu rolé pela Lapa pós Circo Voador fiquei me perguntando por quanto tempo Brown segurou esse trabalho e aqueles sentimentos para si. Eu vi um Mano Brown sorrindo no Circo Voador. Alguém tem a verdadeira noção disso? Quem realmente o acompanha e segue a história e a luta dos Racionais, sabe o quão difícil seria ver aquela cena de um Mano Brown livre, sem amarras e demonstrando sentimentos que a gente não conhecia. Ou não queria conhecer.
Mano Brown é uma espécie de Mandela do Rap nacional. Sério. Mandela abdicou da sua vida pessoal e dedicou os seus esforços e sua luta a uma causa que era muito maior do que ele próprio. Acredito que se você quer ser referência e entrar realmente na história por ter deixado alguma verdadeira marca no mundo, algum grande sacrifício você terá que fazer. Algum preço alto você terá que pagar. Qual é o tamanho do seu sonho? Será que vale passar 27 anos na cadeia por ele? Será que vale a pena deixar seus sentimentos de “stand-by” por alguns longos anos até que chegue a hora certa de soltá-los para um público que você dedicou sua vida e que provavelmente não te entenderia?
Pro Mandela valeu a pena. Pro Mano Brown acho que tá valendo também. Ele tá menos agressivo, menos sisudo, menos intempestivo. Mas meu coração e intuição me dizem que ele está 10 vezes mais perigoso hoje, pelo simples fato de ter evoluído. Brown hoje ocupa espaços, atinge pessoas que quem tinha medo da mudança e revolução que o poder da palavra dele poderia causar não imaginaria. E é aí que tá o verdadeiro perigo para eles. Quando eles menos esperarem, Mano Brown assume de novo o seu papel revolucionário – que nunca deixou de existir – e passa essa mensagem de uma nova forma. Sempre eficaz e direta.

Tudo tem a hora exata para acontecer. Deixe o seu mito ser humano. Deixe o artista ser artista. Não fique esperando muito dele. Deixe ele sair da sua zona de conforto pra te tirar da tua zona de conforto. Todo mundo merece ser o que quiser e ser minimamente respeitado e admirado por isso. Se o seu sonho não te exige sacrifícios, alguma coisa tá errada por aí. Mandela se sacrificou e virou um mito. Mano Brown se sacrificou, virou um mito e tem a coragem de pôr isso em risco justamente para ser o que Mandela demorou 27 anos para ser. Livre.
Foto: Lucas Sá