Eu amo mototáxi | Coluna da Taísa

Quem tem intimidade comigo sabe que se eu não fosse artista eu seria mototáxi. Primeiro porque mototáxi é a cara do Rio, e eu ainda sou o tipo de pessoa atrasada que ama o Rio de Janeiro. Quem tá realmente conectado com a realidade, não ama o Rio, odeia.

 

Como não é uma profissão regulamentada, eu não sei exatamente o que você precisa para ser contratado como mototáxi, mas acredito que ser Muito Doido é um dos pré requisitos.

 

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Não tem jeito, a verdade mesmo, no duro, é que a maioria dos mototaxistas é tudo muito doido, viciado em cortar pela direita. O que é até bom, porque poucas mortes são tão lentas quanto aquelas em que você investe seu precioso dinheirinho pra escapar de um atraso e o mototáxi é lerdão.

 

Outra parada importante para se dar bem nessa profissão é ter aquela marra pitbulzada, sabe como é: bigodin finin, cabelinho na régua. 

 

Lembro de uma vez quando, saindo da Nova Holanda, peguei uma moto. O piloto parecia ter uns 16 anos e era dessas pessoas que curtem rir na cara do perigo, fazia as curvas fechadinhas e cortava todos os carros, se enfiando em qualquer brecha. Eu, como uma boa garota da pista, nunca, e digo absolutamente, nunca seguro na traseira da moto; isso é a regra básica pra não ser tirada de otária na favela. Eu uso aquele velho truque das boas de carona: jogo o corpo pro mesmo lado que o piloto e me seguro pelas pernas. Se ele for fazer uma curva ou estiver correndo muito, é só prender o quadril do boy com as pernas e curtir o vento na cara. 

 

Mas esse garoto em especial corria muito, então fui obrigada pelas circunstâncias a envolver meus braços no peitoral dele. Talvez eu tenha me aproveitado um pouco e minha mão tenha escorregado para a barriga de tanquinho do boy, que não perdeu tempo e soltou: “Já que tá fazendo carinho, pega logo no grandão”.

 

Andar de mototáxi requer coragem. Confiar numa pessoa que você nunca viu e subir na  moto dela, enquanto desafia as ruas dessa cidade maluca, não é para imaturos.

 

Umas das minhas maiores crises começou dentro dessa minha rotina de subir na moto alheia. É que por aqui, na maiora das favelas, não se anda de capacete. E tudo bem, cresci assim. Quantas vezes já peguei a Avenida Brasil de motão a mil, sem nenhuma proteção? Mas em algum momento da minha vida isso me pareceu uma inconsequência do caralho.

 

Eu chegava no ponto de moto pra fazer meu percurso diário do Chapadão até o metrô da Pavuna, que dura uns 6 minutos, subia na moto e meu coração acelerava. A real é que eu morria de vergonha de pedir um capacete, me sentia uma velha. Aos 30 anos, eu fui reduzida a uma mulher medrosa ou, pior ainda, uma mulher que tinha acabado de ganhar alguma consciência mas sem coragem de lutar pelas suas próprias certezas. Patético.

 

Mas aí eu esqueci da terceira coisa fundamental pra você ser o bom profissional no ramo dos mototaxistas: ser um ouvinte compreensivo. Contei pro Rael que tava ficando velha, que não era mais uma novinha que não pensa no futuro e que, por isso, achava fundamental usar o capacete nesses últimos tempos. 

 

Essa conversa foi umas daquelas típicas conversas com você na moto, gritando feito uma louca, tentando fazer sua voz ultrapassar o vento. Mesmo assim, depois desse papo, todos os dias quando eu chegava no ponto, antes de subir na moto, alguém gritava com carinho: “não esquece o capacete, ela gosta mais assim”.

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