Quebrar barreiras que na maioria das vezes são impostas por puro preconceito e necessidade de autoafirmação é estar diariamente fazendo um papel de revolução dentro da sociedade. Pensar em produzir cultura e ocupar uma posição de minoria dentro da arte é ser necessário, como Joana é, importante e necessária.
Joana Mendes de Mello tem 26, mora no Rio de Janeiro e provavelmente ela já produziu algum evento ou feira que você participou ou simplesmente caiu de paraquedas. Ela joga nas 11, suas produções dentro da cultura urbana são um reflexo da ascensão da comunidade LGBTQ dentro de esferas que são em maioria ocupadas por héteros normativos.

Nota-se que a missão de Joana não é estar dando toda sua energia produzindo eventos e entrando em contato com diferentes frequências em troca de dinheiro apenas, ela quer chegar em um status de pleno descanso com a consciência limpa e com suas meditações em dia, uma verdadeira amante da espiritualidade e de como ela influencia nosso cotidiano.
Fernando é uma grande referência para Joana, ela cita seus 12 anos de amizade como uma das coisas mais importantes para sua vida enquanto produtora e ser humano. Diego Moura, ou Diegão, é uma das pessoas que a introduziu em seu trabalho, abrindo algumas portas e a incentivou a conquistar outras.
Joana menciona Gustavo do Marginal Men como outro apoio importante para sua trajetória,
Cauane Pedrosa é uma referência para Joana, ela me fala sobre quando se descobriram em um momento muito próximo e até hoje compartilham suas vidas.
Outra pessoa querida é Gabriela Machado uma amiga importante que Joana comenta logo depois citar a importância de participar de tantas frentes de produção, onde o benefício disso tudo é conhecer profissionais e amigos que jamais serão esquecidos.
Uma questão importante que Joana menciona é a política do Trans Free, uma ação de inclusão e relevância da comunidade trans, abrindo portas para a cultura como um todo e desmistificando essa noção que toda trans precisa estar na rua ou trabalhando com sexo ou pornografia.
Em um determinado momento ela me conta sobre a vinda de seus pais do Ceará para o RIo de Janeiro e como foi importante ver seus esforços para que ela tivesse uma educação de qualidade ao longo de sua formação.
Joana toca na tecla dos prejuízos sociais que ser travesti carregam, como a maioria que nem termina a escola mas ainda sim dão um jeito de fugir desse espaço opressor e como o país que mais mata travestis é o que mais consome material pornográfico, fazendo uma ponte a mesma indagação relatada por Pam Belli, do último Radar.
Ainda falando sobre origens, para a produtora nossos locais de descoberta são vários e como isso agrega nossa cultura já que em cada canto, em cada vivência existe algo que iremos aprender e trazer para nossas vidas.
Seguindo essa linha, Joana sempre teve uma relação positiva com eventos, ela sempre produziu aniversários mesmo antes de se iniciar como profissional. Nessa fase da vida a questão não era puramente o dinheiro mas sim construir narrativas que estivessem alinhadas com a proposta da festa, mesmo que terminando em uma mesa de bar com todos os convidados felizes.
A correria de uma produção é ter jogo de cintura, lidar com as temporalidades e para Joana fazer com amor é importante e necessário, é o que faz com que a narrativa construída dure e alcance novos espaços.
Joana já trabalhou em eventos importantes do Rio de Janeiro, dentre eles o Minha Luz é de LED, Até as 4, I Hate Mondays, Love 2 Hate, entre várias outras. Recentemente, Joana esteve na equipe de produção da Kelela no Rio de Janeiro, onde montou uma bancada de entrada com 6 travestis, ou seja, um evento onde a maior parte dos profissionais eram travestis, além de estar presente na after do lollapalooza em colaboração com a Adidas. Isso é inclusão.
Atualmente, Joana tem projetos no gatilho e acha importante reiterar sua ocupação nesses lugares, como profissional que não deve ser vista apenas por sua sexualidade mas sim pelo que a mesma tem a oferecer enquanto produtora e criadora como o salão FNLIJ produzido no dia da captação do radar.
Este salão é produzido pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil na Biblioteca Parque no Centro do Rio de Janeiro que completou 51 anos esse ano e tem como propósito e intenção a ascensão e promoção do saber para os jovens leitores, tendo a literatura como um grande motor de conhecimento tendo cerca de 5 a 14 mil crianças divididas entre os dias de atividade.
A produtora tem uma plataforma de comunicação intitulada Travesti Eventos, que surge como uma linguagem pessoal de Joana. A rede lida com eventos e busca demarcar um local de voz, conquistando esferas pontuais na arte, provocando a sociedade.
Joana me diz que ser uma travesti é ser todas ao mesmo tempo, e por isso, Travesti Eventos se torna uma rede muito maior que apenas o evento em si. É sobre conectar essa camada com todos os outros grupos, seja afetivamente, profissionalmente ou por puro lazer.
Ela é pensadora, fomentadora, agitadora cultural, produtora e carrega responsabilidades enormes em seus ombros. No fim, afirma mais uma vez a importância de ocupar, sabendo que outras travestis carregaram esse peso passaram por inúmeras experiências negativas para dar espaço ao seu trabalho atual, como uma fonte de aliança única e verdadeira, sempre trabalhando com integridade, quebrando a segregação histórica sem esquecer do passado.